[Filmes] ‘Quem você pensa que sou’ e essa bagunça entre o real e o digital
Por Márcia Lira em
Entrei no cinema para a sessão de Quem você pensa que sou, com a Juliette Binoche achando que veria uma comédia romântica francesa, inteligente e moderna. Saí na subida dos créditos perplexa, com identificação e angústia.
A primeira coisa incômoda do filme dirigido pelo francês Safy Nebbou é que a gente se identifica até demais com a personagem Claire, interpretada pela – linda e maravilhosa – Juliette Binoche.
Ela é uma professora de literatura, uma mulher de 50 anos atraente, independente, mãe de dois filhos, que está processando o fim doloroso de um casamento de 20 anos. Então decide criar um perfil no Facebook e começa a ‘flutuar’ no mundo virtual.
É onde ela passa a conversar com o jovem Alex. Só que on-line ela assume a identidade fictícia de Clara Antunés, uma estagiária de moda de 24 anos. Afinal, como Alex poderia se interessar por uma mulher de meia idade?
Clara Antunés e Alex vivem uma intensa história de amor. Virtual. Fantasiosa. Contemporânea.
A gente ouve toda a história porque Claire conta à sua nova psicóloga, com todas as dissimulações capazes de acontecer quando um paciente precisa expor algo controverso (e se expor) a um profissional.
O ponto de vista de uma mulher madura é um olhar diferente e pouco comum sobre as relações que temos hoje, convocando a internet como intermediária. Em geral, a mulher em busca de companhia no mundo virtual só é tratado em comédias românticas, com um toque de ridicularização.
Esse caso é mais ‘precisamos falar sobre as relações on-line’ dos adultos.
O filme consegue uma façanha. Ao mesmo tempo em que dá esse panorama da situação, em que podemos julgar Claire e as consequências das suas atitudes, deixa a gente tão perto que ouvimos trincar o nosso telhado de vidro. Porque isso está acontecendo com a gente agora.
Afinal, quem já não tem ou teve uma relação mais virtual do que física? Como não ter uma identidade digital diferente da persona que se comporta no mundo físico?
É um filme maravilhoso sobre responsabilidade com o outro em épocas de relacionamento on-line, sobre solidão na maturidade, sobre a crueldade com o envelhecimento da mulher, sobre superação e sobre mais tanta coisa. Que se passa em Paris, mas poderia ser aqui mesmo no Recife.
Eu ainda estou digerindo a obra, e por isso normalmente não escreveria sobre ela. É uma digestão lenta, e não tem chá que dê jeito. Mas precisei deixar aqui a recomendação. É forte, é necessário, sensível e nada entediante, cheio de reviravoltas, para você não perder a oportunidade de se deixar conduzir pelo filme.
Quem você pensa que sou, do diretor Safy Nebbou foi visto no Festival Varilux de Cinema Francês 2019, no Moviemax Rosa e Silva. Assista ao trailer legendado.
3 comentários
Deixe um comentário